Se alimentar é muito mais do que calcular calorias e balancear nutrientes
Já ouviu falar na nutrição comportamental? A nutricionista parceira do Sítio, Mariana Escanho, trouxe informações sobre essa linha da nutrição, que busca uma reconexão entre nós e a alimentação! Que tal pensar no alimento para corpo e mente?
Texto por Ana Luísa Vasconcellos
Já pensou na possibilidade de se reconectar com o seu corpo? Com um mundo globalizado e baseado na comunicação, é cada vez mais fácil encontrar informações sobre tratamentos médicos ou “dicas nutricionais”. Mas, será que existe uma fórmula para a vida saudável? A nutrição comportamental, linha de trabalho da nutricionista Mariana Escanho, especialista em educação e comportamento alimentar, defende que não há uma fórmula única para todos. Mariana é nutricionista parceira do Meu amigo tem um sítio e opina que, na verdade, é necessário reconectar-se com o alimento para entender esse processo como social, afetivo e cultural, além de nutricional.
Um levantamento de 2018 feito pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) demonstrou que oito em cada dez brasileiros consideram que se esforçam para manter uma alimentação saudável, com alimentos frescos e nutricionalmente ricos. Entretanto, a pesquisa revela algumas contradições, como o fato de a principal fonte de informação da maioria não ser um médico ou nutricionista. A internet lidera como principal fonte de informação, com 40% de participação, seguida da televisão, com 24%. Por último, estão os médicos e nutricionistas, que representam somente 18% da principal fonte de informação utilizada pelos entrevistados. No levantamento anterior, de 2010, a internet correspondia à principal fonte de informação de 19% dos entrevistados e a televisão de 40% deles.
A difusão cada vez maior de informações, apesar de possibilitar o acesso de muitas pessoas à disponibilização de conteúdos sobre nutrição, muitas vezes pode atrapalhar o processo de conexão com a alimentação. Isto porque, inevitavelmente, pessoas diversas e com organismos completamente diferentes irão acessar esse conteúdo e nem sempre as dietas surtirão um efeito benéfico. Mariana defende uma prática diferente: “Quando a gente segue a nutrição comportamental, consideramos a saúde como algo amplo, então pensamos na alimentação nutritiva, mas também na saúde mental e social. Ou seja, se comer somente o alimento mais saudável possível agride minha saúde mental e social, isso significa que não está sendo saudável”, explica.
Relação afetiva
Os conflitos alimentares, como a compulsão alimentar, a bulimia, a anorexia ou a obesidade mórbida, são assuntos delicados que devem ser tratados sempre com uma equipe multidisciplinar. Muitas vezes, a introdução alimentar de pessoas que possuem conflitos foi feita a partir do chamado “nutricionismo”. O termo significa, basicamente, o olhar para o alimento com uma visão reduzida que enxerga somente o benefício ou malefício de acordo com as propriedades dele.
Segundo Mariana Escanho, os hábitos alimentares têm uma relação direta com a forma que nos relacionamos com o alimento em si. É esta reconexão que ela busca com seus pacientes ao pensar nos hábitos, na cultura e nos afetos. Se o ato de alimentar-se está sempre atrelado à sensação de culpa ou descontrole e à premiação ou castigo, a alimentação provavelmente é conflituosa. Descobrir o que agrada ou não na alimentação é um passo importante para pensar a relação com a comida. Como Mariana explica, transitar pelo aspecto cultural, social e nutricional do alimento é importante para atingir o equilíbrio.
“Descobrir uma alimentação saudável é algo muito gostoso, mas é bom quando isso é genuíno! Ou seja, é legal quando esse movimento é feito exatamente para o bem-estar de todas as áreas. E mesmo dentro da alimentação saudável podemos escolher as nossas preferências e o que nos agrada mais”, afirma Mariana.
Ainda segundo a pesquisa da Fiesp, o número de brasileiros que consideram a comida saudável sem gosto é significativo: correspondem a 52% da população. E, além disso, 56% dos entrevistados considera ter a percepção de ter “comido demais”, afirmação que também se relaciona com a sensação de culpa que Mariana considera ser uma das causas dos conflitos alimentares. “É muito comum encontrar pessoas com uma relação de conflito com a comida e que não vivem em paz com a alimentação. E isso é ainda mais comum em mulheres, vítimas há décadas da pressão estética, que alimenta a mentalidade da dieta de ver um alimento pensando sempre só no malefício e benefício que ele vai causar”, opina.
Seletividade alimentar
A seletividade alimentar é um comportamento de recusa do alimento, geralmente um ou mais grupos alimentares inteiros (frutas, legumes, verduras), acompanhado de uma rigidez alimentar. É típico nas crianças, principalmente antes dos seis anos de idade, na fase pré-escolar. Diante desse problema, é importante que os pais não se desesperem nem recorram a formas radicais de lidar com a situação. A nutricionista comenta que, sobretudo na infância, a forma como a alimentação é introduzida pode criar hábitos para uma vida toda. “Existem muitas imposições e regras feitas às crianças. Na vida adulta, essa insegurança e dúvida de como fazer uma escolha pode ir alimentando, junto com a pressão estética, a ausência de autonomia e de consciência na alimentação”, explica.
A seletividade alimentar não é incomum na infância e em alguns casos pode ser contornada com práticas que incentivem a alimentação e tornem o processo mais prazeroso
Na introdução alimentar das crianças, Mariana defende que não devem ser utilizadas práticas como a chantagem e nem se deve obrigar a criança a comer algo que ela afirma que não gosta. É provável que essa criança, muitas vezes, acabe relacionando comer frutas e vegetais com uma obrigação/castigo e associando o consumo de doces e outras comidas que gosta a uma recompensa ou premiação.
“Forçar e chantagear a criança para comer vegetais e frutas ensina que aquilo não é gostoso e que ela precisa ser obrigada a comer. Ela nem descobriu ainda, ela não tem nem esse conhecimento. Então é interessante tentar despertar o interesse na hora de apresentar um alimento. Podemos falar da cor, do cheiro, da textura! E, além disso, perguntar para a criança o que ela não gostou, tentando realmente entender a qual característica ela se refere quando diz que não gosta. E lembrando que essa condição não é fixa, ela pode ser atualizada diversas vezes!”.
Mais do que balancear calorias e ler rótulos, para seguir uma alimentação saudável é necessário pensar no que o alimento pode proporcionar em todos os níveis e pesar a sua importância na rotina alimentar. Todo e qualquer alimento pode ter uma função para o nosso corpo e tudo é válido se consumido de forma consciente e equilibrada. Para um acompanhamento nutricional pensado a partir dos hábitos alimentares, é importante buscar um profissional da área que possa auxiliar no processo de descoberta da alimentação saudável.
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