A fermentação pode ser associada com “estragar” a comida, mas não precisa ser assim. De fato, o que não falta é alguma das suas comidas favoritas terem algum ingrediente fermentado. Pizza? Leva queijo. Hambúrguer? Tem pão. Vinho? Ele mesmo.
Além de ser um processo antigo e de grande valor nutricional para o corpo humano, a fermentação torna muitos alimentos em verdadeiras iguarias. Conheça tudo sobre o processo e como ele favorece a criação de comidas e bebidas mais saudáveis e mais gostosas.
O que é fermentação?
Fermentação é um processo químico no qual os açúcares presentes nos alimentos são convertidos em ácido lático, gás carbônico ou álcool. Isso ocorre através da ação de bactérias ou leveduras – microrganismos bem comuns no dia a dia.
Tanto natural quanto induzida pelo homem, a fermentação é uma técnica antiga. Usada para permitir que os alimentos fossem conservados por períodos mais longos sem a necessidade de refrigeração, garantiu a sobrevivência da espécie em alguns casos – e a economia de custos hoje em dia.
É uma troca. Trocamos bactérias e fungos indesejáveis por outras benéficas, que ajudam a conservar o alimento, com esse processo. Além disso, torna diversos alimentos saborosos – há quem chame, por exemplo, o queijo de “felicidade sólida”.
Quando a fermentação é boa para o organismo?
Já ouviu falar de probióticos? As bactérias que ajudam o intestino a funcionar melhor? As próprias estão ricamente distribuídas em alimentos fermentados. Seu consumo é sempre indicado para pessoas com problemas intestinais, por exemplo. Mas não para por aí.
Outro benefício é a produção de vitaminas e minerais. Durante o processo de fermentação, os microrganismos produzem nutrientes adicionais, como vitamina B12, vitamina K2 e ácido fólico. Além disso, são ricos em antioxidantes, que ajudam a proteger as células do corpo contra o dano celular e o envelhecimento precoce.
Outro benefício é a melhoria da digestibilidade dos alimentos – a ação de bactérias quebra os macrocomponentes da comida, tornando-as mais fáceis de digerir e absorver.
E quando é ruim?
Nem tudo são flores, e antes que você encha seu prato de fermentados variados, leia as observações a seguir. Algumas pessoas podem ter reações adversas a alimentos fermentados. Algumas condições médicas, como intolerância à lactose ou sensibilidade à histamina, podem tornar o consumo de alimentos fermentados desconfortável ou até mesmo perigoso.
A histamina – substância química produzida durante o processo – tem efeitos danosos documentados em algumas pessoas. Alguns sintomas nessas pessoas podem envolver dor de cabeça, náusea, coceira e vermelhidão da pele.
Outro fator a ser levado em conta é a qualidade dos alimentos fermentados. Alimentos fermentados caseiros, feitos sem as técnicas de higiene adequadas podem ser perigosos para a saúde – não eliminando por completo as bactérias patógenas, por exemplo.
Onde se usa a fermentação na gastronomia?
Como um processo de “estragar” o alimento faz sentido na gastronomia? Pois é, não só faz, como é parte da assinatura da alta gastronomia do país. Processos de fermentação específicos de países e novas variantes de bactérias e leveduras ajudam a dar o “tchan” de alimentos – confira quais!
Pães
A fermentação é uma etapa crucial na produção de pães. Durante o processo de fazer pão, ela age logo após a mistura dos ingredientes e antes da cozedura. A fermentação é responsável por dar o sabor, textura e volume característicos do pão.
A fermentação é iniciada com a adição de levedura à massa. A levedura é um fungo que se alimenta de açúcares presentes na massa, produzindo gás carbônico e álcool. O gás carbônico é o responsável pelo crescimento da massa, dando-lhe volume, e o álcool é responsável pelo sabor característico do pão.
Fatores como temperatura, umidade e tempo de fermentação podem afetar o processo como um todo, e ajustes nos ingredientes e nas condições de preparo, como a adição de fermento biológico, pode ajudar a controlar esse processo.
Exemplos de pães que utilizam fermentação natural incluem o sourdough, pão francês de fermentação natural mais famoso, e a ciabatta, de origem italiana. O sourdough é feito com uma massa fermentada naturalmente, sem a adição de fermento comercial. Isso dá a ele um sabor único e complexo, resultando em um pão com uma crosta crocante e um miolo macio e fofo. Já o ciabatta é outro pão feito com fermentação natural, que é caracterizado por sua textura úmida e aveludada.
Benefícios dos pães de fermentação natural
Além de oferecer uma variedade de sabores e texturas, o consumo de pães de fermentação natural também pode ter benefícios para a saúde. Eles são ricos em nutrientes, incluindo vitaminas e minerais, e possuem uma digestão mais fácil devido ao alto teor de fibra. Além disso, pães de fermentação natural contém probióticos, que podem ajudar a melhorar a saúde do trato gastrointestinal e do sistema imunológico.
Vinhos, kombuchas e cervejas
A fermentação também é uma etapa crucial na produção de bebidas. Três se destacam nesse processo – os vinhos, as kombuchas e as cervejas. Durante o processo de produção de vinho, as leveduras consomem os açúcares presentes nos frutos da uva, produzindo álcool e gás carbônico. Esse processo é o que dá origem ao vinho.
O processo é iniciado com a adição de leveduras selecionadas ao mosto (suco da uva). As leveduras utilizadas são diferentes das presentes em pães e queijos. Diferentes tipos de leveduras podem ser utilizadas para produzir diferentes tipos de vinho, cada uma com suas características, contribuindo com o sabor, aroma e textura final.
Países famosos pela produção de vinhos, como a França, Itália, Espanha e Chile, usam diferentes tipos de leveduras para sua produção. Por exemplo, a levedura Saccharomyces cerevisiae é comumente usada na produção de vinhos tintos e brancos secos, enquanto a levedura Saccharomyces bayanus é usada na produção de vinhos doces e espumantes.
Outras bebidas fermentadas incluem a kombucha e a cerveja. A kombucha é uma bebida fermentada feita com chá verde ou preto, açúcar e uma cultura viva chamada scoby (colônia de bactérias e leveduras). A fermentação da kombucha leva cerca de uma semana e o resultado é uma bebida com baixo teor alcoólico, rica em probióticos e antioxidantes.
Já a cerveja é uma bebida alcoólica fermentada feita com cevada, lúpulo, água e leveduras. Na cerveja a fermentação leva de uma a três semanas e o resultado é uma bebida com teor alcoólico variando de 4 a 12%. A cerveja pode ser dividida em vários tipos como lager, ale, pilsen, entre outros, cada um com suas características únicas de sabor, aroma e cor.
Queijos
A fermentação também é uma etapa importante na produção de queijos. Ao contrário dos pães e vinhos, a fermentação de queijos é feita com bactérias ácido-láticas ao invés de leveduras.
Essas bactérias consomem o açúcar presente no leite, produzindo ácido lático e sabor característico do queijo. O ácido lático também ajuda a coagular as proteínas do leite e ajuda a dar a forma e textura do alimento.
A fermentação de queijos pode ser realizada de diferentes formas. Leite pasteurizado ou cru produzem resultados específicos, assim como a adição ou não de rennet (enzima usada para coagular o leite) ou bactérias adicionais. Cada um desses processos vai dar origem a um tipo de queijo diferente.
Os queijos frescos, como o queijo cottage e o ricota, são exemplos de queijos feitos com fermentação rápida, geralmente levando menos de 24 horas para serem produzidos. Já os queijos maturados, como o gouda e o cheddar, passam por longos períodos de fermentação, que podem ser de algumas semanas a alguns meses.
Isso dá a eles um sabor mais complexo e uma textura mais firme. Alguns queijos também passam por um processo de cura ou tempero, onde são expostos a umidade, temperatura e condições específicas para desenvolver seu sabor e textura únicos.
Benefícios dos queijos
Além de oferecer uma variedade de sabores e texturas, o consumo de queijos de fermentação natural também pode ter benefícios para a saúde. Eles são ricos em cálcio, proteínas e vitaminas do complexo B. Alguns estudos também sugerem que o consumo de queijos ácido-láticos pode ter efeitos benéficos sobre a saúde do trato gastrointestinal e do sistema imunológico, e pode até mesmo ajudar a reduzir o risco de doenças cardíacas.
Medidas para impedir a fermentação
Se, no entanto, você não quiser nada além de consumir um produto fermentado feito por profissionais – seja porque não confia em si mesmo para produzir um sem toxinas ou só quer fazer outra coisa – separamos algumas medidas clássicas de preservação de alimentos para que não fermentem:
Pasteurização e Esterilização
A pasteurização é um processo no qual os alimentos são aquecidos a uma temperatura específica por um período de tempo específico, matando qualquer microorganismo. A esterilização é um processo semelhante, mas os alimentos são aquecidos a temperaturas ainda mais elevadas, garantindo uma esterilização completa.
Sem microrganismos – bons ou ruins – os componentes dos alimentos são mantidos e, consequentemente, nenhum processo químico ocorre. Sem fermentação.
Conservas
As conservas são exemplos de alimentos processados, justamente com o intuito de impedir a proliferação de qualquer tipo de bactéria. Algumas empresas, preocupadas com a saúde – como os produtores orgânicos – usam conservas conscientes do valor nutricional. Outras, mais comumente achadas em mercados, nem tanto.
Exemplos famosos de conservas incluem ervilhas, pepinos e pimentões, que são geralmente esterilizados ou pasteurizados antes de serem embalados em vidro ou latas. Outros exemplos incluem frutas em calda, como damascos e cerejas, que são conservadas em açúcar ou xarope, e frutos do mar, como atum e sardinhas, que são geralmente conservados em óleo ou água salgada.
Ácidos
Outra forma de conservação de alimentos é a adição de conservantes, como ácido ascórbico, ácido cítrico e ácido benzoico. Esses conservantes ajudam a inibir o crescimento de microorganismos, impedindo a fermentação e prolongando a vida útil dos alimentos. Entretanto, seu consumo está diretamente relacionado ao comportamento industrial dos alimentos – algo que sempre recomendamos que você fuja.